XVII
Na fazenda de Beatrice, a agitação iniciou com o amanhecer, todos na casa
se apressavam em preparar o jantar de noivado.
Rosa contemplava Beatrice indo e vindo com a leveza dos
enamorados.
O momento tão almejado acontecera, a filha estava vivendo um
grande e
verdadeiro amor.
A festa
transcorreu em meio a muita descontração. Fernando e Beatrice
aproveitaram
para anunciar o casamento para o próximo
verão.
No verão
seguinte Fernando e Beatrice, se casaram e passaram a residir na
capital. A
jovem continuou no exercício de sua profissão, ora ou outra
viajava à
trabalho.
Ao
retornar, por muitas vezes, não encontrava Fernando, assim como
acontecia
a qualquer hora do dia ou da noite de ele se ausentar sem avisar
e/ou se
despedir. Estava sendo bem mais difícil do que ela imaginara,
entretanto
seria preciso se acostumar, afinal sabia o porquê, o rapaz foi
muito
claro sobre a sua atuação profissional.
Diante do
contesto e em meio a idas e vindas, usufruíam
de momentos
gratificantes,
não desperdiçavam as oportunidades. Curtiam a gastronomia
caseira, o
vinho, a lareira, a companhia dos amigos e principalmente a
companhia
um do outro. Vez ou outra até conseguiam
viajar em férias
juntos.
Após dois
anos de casamento, já falavam em ter filhos, embora um pouco
assustados,
mas enfim deixariam a natureza se encarregar, quando
acontecesse,
certamente saberiam como conduzir.
Numa noite
de inverno, que a neve caia magnífica,
crianças e adultos se
ocupavam em
fazer e adornar lindos bonecos de neve, Beatrice
contemplava
através da vidraça da janela de seu quarto e não demorou
muito a
descer e juntar-se ao grupo.
Não lembra
muito bem, mas acredita que já estava ali há mais ou menos
uma hora,
quando ouviu o tilintar da campanhia de sua residência, o que a
fez
virar-se e se deparar com o militar parado, junto à porta.
O sangue
gelou em suas veias causando-lhe uma imensa fraqueza, por todo
o corpo, o
que lhe impedia de ir ao
encontro do oficial.
Fernando
morreu num acidente de automóvel, causado pelo nevoeiro,
numa
estradinha de chão em meio as montanhas, no entardecer daquele
mesmo dia.
Com morte
de Fernando Beatrice reviveu a perda dos pais, sabia o que a
esperava:
a dor, a solidão interior, a saudade, a interrupção de sonhos
acalentados.
Os dias
que se seguiram se tornaram penosos, idealizava que a qualquer
momento
ele entraria pela porta, com aquele sorriso maroto, cheio de
saudades.
A jovem
procurou mergulhar no trabalho, mas não estava sendo eficiente
para
aplacar a dor da ausência, a certeza do finito.
Sentindo a
necessidade de se recolher, Beatrice decidiu passar uma
temporada
na fazenda.
Rosa,
Inácio e o padrinho Leopoldo estariam lá, como sempre estiveram e,
neste
momento, era tudo o que ela precisava, estar com eles, ser abraçada
por eles.
Os dias e
noites eram intermináveis, cada
amanhecer era penoso,
apesar da
visitas de amigos e parentes.
Numa dada
manhã a jovem acordou mais disposta, decidiu ir até o bosque.
A
primavera proporcionava um cenário paradisíaco. Andou até que chegou
à clareira
e localizou o balanço de madeira e corda, amarrado numa imensa
árvore.
Não resistindo sentou-se e iniciou a embalar-se.
O vento
morno lhe acariciando o rosto, o perfume
das flores e o canto dos
pássaros lhe
proporcionava uma imensa paz.
Quando
Beatrice parou o balanço foi surpreendida por um movimento,
dentro de
seu ventre, que durou apenas uns segundos, mas o suficiente para
lhe
inquietar.
Um misto
de felicidade e dúvida se fez sentir.
O receio
de estar se iludindo a levou a tentar desconsiderar o acontecido.
Voltou
para casa e não fez qualquer comentário.
Rosa, como
sempre e por conhecer bem a filha, iniciou os
questionamentos,
ao que a jovem foi administrando até o momento que
adentraram
na cozinha e Beatrice, fez uma careta, ao sentir os aromas das
suas refeição preferidas.
Mãe e
filha se abraçaram longamente, riam e choravam.
Sim, Beatrice
estava grávida.
Não tinha
como negar o ser, pulsando no seu ventre,
exigia que ela
deixasse
de se ocupar da morte e passasse a se ocupar da VIDA.
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